Ensinando a pescar
12/06/12 13:46Hoje o texto não é meu, é longo e vale cada palavrinha! Quem escreveu foi o João Felipe Chiarelli Bourscheid, de Pelotas (RS), beneficiário da TdB em dois projetos: Dentista do Bem e Assistente do Bem (curso de auxiliar de saúde bucal). Maduro, comovente… Em total sintonia com o que acreditamos! Parabéns, João Felipe, temos muito orgulho de você e de todos os nossos jovens!
Não dê o peixe…
…ensine a pescar. E faça precisar pescar.
Atualmente, num mundo de sete bilhões de habitantes, a maioria das pessoas já nasce com menos oportunidades. Muitas vezes, começando com uma família debilitada, com problemas financeiros, envolvimento com drogas… Crianças… Adolescentes… Todos sem esperança na vida. Pessoas que não pensam no significado da palavra futuro.
Imagine que você conhecesse um adolescente desse tipo. Talvez você sentisse pena e quisesse ajudá-lo hoje, quem sabe, dando uns trocados. Ou talvez dando uma caixinha de leite. Isso é até comum de se ver. Mas, quando alguém faz tal ato de solidariedade, não pensa que amanhã talvez aquele mesmo adolescente não tenha a mesma sorte. Você ajudará amanhã novamente? E depois? Vai ajudá-lo pela vida toda?
Ajudar é algo importante, sem dúvida, mas somente se essa ajuda vier combinada com uma forma de a pessoa evoluir. Caso contrário, essa ajuda não será nada mais do que em vão.
Quando eu entrei no projeto Dentista do Bem, achava que estaria entrando apenas como paciente. Achei que receberia o tratamento ortodôntico que eu precisava e estava feito. Nada mais que isso. Mas tinha me enganado.
Claro, ganhar o aparelho ortodôntico foi bom. Mas o que mais me chamou atenção nesse projeto foi o curso de Assistente de Saúde Bucal. Nossa, como ele mudou a minha vida! De verdade.
Conforme o curso foi se desenvolvendo, o que eu ia aprendendo ia conversando com a minha vida. Primeiro começou com o aprendizado de uma técnica mais correta de se escovar os dentes. Quem não escova os dentes? Pois é, toda vez que eu ia escovar me lembrava daquela aula: ao invés de movimentos retos, fazer movimentos circulares nas faces vestibulares (nome dado a região do dente que fica do lado de “fora” da boca). Fazia sentido: movimentos retos são mais agressivos e atacam mais a gengiva e ainda por cima não atingem as faces proximais e distais (faces entre um dente e outro).
“Ok. Mas você poderia aprender a escovar os dentes com o seu dentista, o que tem de mais?” Eu costumo a almoçar no refeitório do IF-SUL junto com colegas, amigos e irmãos (amigos que eu realmente considero). Como almoçamos, temos que escovar os dentes depois e fazemos isso de uma forma coletiva. Então, comecei a notar que não era só eu que escovava os dentes de forma incorreta, mas também os que almoçavam junto comigo.
Isso me fez alertá-los de que a forma com que escovavam os dentes estava incorreta… Para uns isso foi positivo; eles entenderam a motivação de escovar os dentes daquela maneira. Mas outros continuaram a escovar os dentes da maneira antiga. Por quê? Bom, a meu ver isso tem a ver com o espírito de rebeldia. Mesmo sabendo que o que está fazendo é errado, a pessoa continua fazendo para expressar seu descontentamento. Atitude de adolescente? Não digo; depois quando trabalhei em alguns lugares vi situações muito semelhantes.
Mesmo minha iniciativa não tendo ajudado a todos que ali escovavam os dentes, senti que alguns pelo menos eu consegui alcançar. E isso já foi muito bom e foi nesse exato momento que eu deixei de pensar que eu estava no projeto apenas para ser paciente, mas poderia ter um papel ativo na melhoria da saúde das pessoas – além da minha, é claro.
Semana passada, uma irmã minha veio me dizer que estava há dois anos com três dentes para fazer tratamento de canal. Nesse dia, ela chorou de dor. Fiquei com muita pena. Dava vontade de eu mesmo tentar tratar – algo que acredito que já entendi uma boa base inicial de como se faz. Mas infelizmente não tenho nem permissão legal, nem instrumental, nem material para isso. Medo de errar, até eu não tenho, porque acredito que até mesmo a mão de um dentista pode cometer um erro, porque o dentista também é humano. Mas certamente, se fosse colocar a mão na boca de alguém, só faria isso depois de estudar bem mais. Talvez isso até me leve a seguir carreira na área da saúde, mas daí já é outra história.
Bom, como não podia fazer a cirurgia propriamente dita, me detive em explicar como era o procedimento. Isso, é claro, não resolveu o problema da dor de dente, mas ajudou a entender o que o dentista iria fazer em sua boca, o que além de fazer esquecer um pouco da dor, fez minha irmã ter mais segurança.
O mais interessante é que fazer o curso não influenciou somente minha vida na área da saúde; até mesmo na área das artes tive uma modificação. Tudo é uma longa história que vou tentar resumir: algo comum a quase todos meus irmãos é que somos Straight Edge, isto é, não consumimos nenhum tipo de droga, seja álcool, cigarro, maconha ou qualquer outra. E mesmo respeitando a opção das outras pessoas quererem usar as drogas supracitadas, muitas vezes aconselhamos outras pessoas a não usar ou deixar de usar. E uma das formas que fazemos isso é por meio do estêncil (uma técnica de gravura em que se recorta uma figura numa chapa e pinta essa chapa vazada sobre uma superfície) para fazer cartazes e camisetas. Enfim, numa dessas camisetas (a que eu estou usando na foto) fizemos um crânio de uma pessoa bebendo vinho e, ao mesmo tempo em que fazia isso, seu cérebro sangrava. Claro, exagero. Mas um detalhe importante desse desenho é que o cadáver tinha vinte dentes (supondo que, visto de perfil, apareça apenas metade dos mesmos), o que levava a crer que aquilo era um cadáver de uma criança (aqui, criança num sentindo mais amplo, no sentindo de ser ainda novo), que é mais vulnerável aos efeitos irreversíveis da droga.
Uma das últimas experiências que o curso me possibilitou foi o estágio de ASB. Nominalmente eram 60 horas de estágio, sendo apenas 6 horas por dia. Mas tive a sorte de conseguir estágio numa clínica de uma dentista tão boa que eu ficava lá, por vontade de aprender, das 9h até às 21h na maioria dos dias, parando, é claro, para ir em casa e almoçar. E a dentista era boa não somente na área da odontologia, mas também era uma pessoa muito interessante para dialogar. Dentre os vários assuntos que conversávamos, um deles era sobre a superproteção paterna e materna. Nós dois concordávamos que a superproteção dos filhos impede que os mesmos enfrentem experiências por si só em suas vidas, aprendendo a se virar e ter uma visão de que a vida deles não depende somente do que os outros vão lhe dar, mas sim do que você vai atrás.
Na parte da odontologia propriamente dita, acabei entendendo de fato como era que se tratava um canal, por exemplo. Apesar de algumas explicações da apostila, ver alguém lidar com essa situação ajuda a entender a utilização de cada um dos materiais aplicados. E na função de ASB ganhei vários elogios ao organizar os instrumentais (enfileirando e separando os instrumentais em classes como curetas, pinças, espelhos, espátulas etc.), que me ajudou bastante para ter velocidade e precisão na hora de entregar o instrumental necessário.
Por fim, gostei muito da experiência de não ter apenas ganhado o peixe – que também foi boa e meus dentes já estão bem diferentes do que estavam antes do tratamento –, mas de ter aprendido a pescar e ainda mais de ter tido várias oportunidades (o estágio e os desafios que ocorriam no dia a dia) para contribuir um pouco com o meu conhecimento. É nesse sentido que eu acho que podemos ajudar todas as crianças, adolescentes e (por que não?) adultos: ajudando, mas dando possibilidade de ele mesmo evoluir a ponto de ele mesmo se ajudar e também ajudar a outros. É como no filme Patch Adams: o Amor é Contagiante, onde cada paciente também era médico no sentindo amplo da palavra.
Parabéns a todos envolvidos no projeto e que ele ajude a atingir vários outros adolescentes!
Meu ser chora de alegria.
Parabéns Felipe pelo posicionamento claro e maduro, estás no caminho certo. Parabéns também aos pais do Felipe, que o criaram desta forma consciente e participativa. Grande futuro para ti Felipe!!!! Beijão!!!!
COM CERTEZA ESTA SEMENTE FOI PLANTADA………LINDO E DE UMA CLAREZA!!!!!!!!!
esse gaoto falou toda a verdade… precisamo mudar nossa mente, não podemos achar que iremos mudar o mundo dando trocados, precisamos dar a oportunidade de tranformar a vida de uma pessoa, ensiná-la a ser cidadão, a mostrar que é possível ter seu espaço na sociedade.
Muito bom ler tudo isso….. Prova de “SALDO POSITIVO”….. E creio que muito outros conseguimos e não temos o depoimento!!!!
Obrigado a todos pelos elogios. 🙂 É tive que resumir várias histórias para que o texto não ficasse longo de mais. Mas, com certeza, poderei estar relatando outras em outros textos. 🙂
Escrevam vocês também. 😉
Adorei teu depoimento João.Como disse para tua mãe,tu és um jovem muito responsável e maduro.Tens um caminho muito bonito pela frente.Apesar de falarmos da superproteção dos filhos pelos pais,temos sempre que ouvi-los. Sempre querem o melhor para nós,talvez não da maneira que queremos mas, sempre com muita preocupação e zelo.Na vida temos que usar de bom senso antes de tomarmos atitudes de que possamos nos arrepender mais tarde.Espero ter contribuído com os teus conhecimentos profissionais e ter influenciado positivamente para o teu futuro te ensinando a pescar,como falaste.Bjos.Sucesso!!!
O Projeto alavancou uma mudança enorme no Jõao. Sabe aquele jovem que tem potencial e não se dá conta…era o caso do João. Um depoimento como este prova que estamos no caminho certo…estamos plantando sementes e colhendo mais rápido que imaginamos.
LIndo texto. De forma clara e objetiva, conseguiu escrever tudo aquilo que eu acredito. Pois eu não acredito em assistencialismo e sim uma forma de mostrar um caminho para ser trilhado com seus porprios pés. Parabéns, pelo texto.
É bom ver que o trabalho da Turma do Bem , realmente muda a vida das pessoas …….
muito bonito o texto!!1
Emocionante!
Inspirador!
Fico muito feliz ver o resultado do trabalho da TdB!!!!
lindo o texto do João Felipe, isso só reforça a responsabilidade que todos nós temos em não fazer assistencialismo se não ha de fato um real envolvimento com quem precisa.
Sensacional, me fez lembrar quando eu fiz o curso…. Emocionante
Ontem ouvi de uma ASB que a paciente do dentista do bem com quem ela trabalha, não sorria e não conversava. Após alguns meses de tratamento já sorri e conversa nas consultas. A mãe está radiante com as mudanças. Hoje somos brindados com esse lindo texto. Muito feliz e estimulada a continuar trabalhando para que mais jovens possam ter uma oportunidade.
quando leio um depoimento desses me sinto de tanque cheio…
Emocionante!!!!! TdB mais uma vez fazendo a diferença!
Ta aí um rapaz que SABE do que está falando!
sem palavras para dizer!particularmente me vejo nessa historia e posso concorda com cada pingo no i do que foi dito!!!
Chorei….
comovente!
Eh por isso que sou Dentista do Bem…ver e ler historias assim são os melhores estímulos!
TdB transformando histórias… de verdade!
É isso que faz toda a diferença!
Ah, que texto lindo! Menino do bem. Parabéns!
Uma experiência muito rica de fato, um exemplo a ser sempre lembrado. Tomamos decisões em nossas vidas e em seguida, aceitamos suas consequências (ou deveríamos aceitar), sendo elas boas ou ruins. O futuro depende do presente, do que fizermos e do que queremos ser.
Que linda forma de expresarse, de emocionarse y de agradecer, gracias a personas como el vale cada dia mas la pena.
Quando lí, veio um sentimento pleno e a certeza que estamos trilhando caminhos bons.
Um ótimo exemplo de como o trabalho da TdB transforma a vida desses jovens!